Baseado e adaptado do livro HowWe Decide, do Neurocientista Johan Leher. Tradução livre.
O objeto de estudo da Neurociência não é, como a maioria das pessoas pensam, o cérebro. Este órgão de integração de experiências já é bem conhecido dos cientistas, e a Neurociência nada acrescentaria a esse campo de conhecimento se dedicasse seus esforços para compreender o funcionamento cerebral. As grandes descobertas da Neurociência para o desenvolvimento humano estão associadas ao estudo do cérebro enquanto atua da melhor possível, e assim tomar as decisões mais acertadas e promover felicidade.
Uma das maiores descobertas da Neurociência sobre tomada de decisão eficaz tem suscitado ecos na tradição científica que alcançam Aristóteles. A Neurociência pode comprovar que as emoções são essenciais para os processos de tomada de decisão e que de fato os componentes racionais seriam apenas coadjuvantes nesse processo. Para sustentar essa nova perspectiva, tomemos um exemplo real. Os jogadores de futebol americano, ao saírem de suas universidades e ingressarem nos campeonatos profissionais, atendem a um tipo de teste de inteligência, e assim são estatisticamente categorizados (vocês sabem que os americanos adoram as estatísticas nos esportes). Esse teste de inteligência é chamado Teste Wonderlic, o qual mede um tipo especial de pensamento: o lógico-matemático. Ele é composto por algumas dezenas de questões com operações aritméticas que se elevam em dificuldade, iniciando com algo como "Fulano vende um produto por 0,21 a unidade. Quanto custará quatro unidades?" e finalizando com questões como a seguinte: "Três sócios em uma empresa concordam em dividir seus lucros igualmente; J investe $ 9.000,00 na empresa, K investe $ 7.000,00 e L investe $ 4.000,00. Se os lucros são de $ 4.800,00, o quanto receberá J, se os lucros são divididos na proporção dos investimentos ?". No futebol americano, o grande astro do time é como o camisa 10, o cérebro do time, aquele sujeito que faz o time jogar, e de quem o time depende para jogar. É fácil imaginar um quarterback em ação mesmo para aqueles que não estão acostumados com o esporte: quando os jogadores estão reunidos no centro do campo, abaixados e falando números e códigos para distrair e enganar o adversário, e quando dão a saída de bola a jogam para um cara que está de pé, atrás de todos os outros e que procurando para quem lançar essa bola? Pois bem, esse é o quarterback.
Voltando ao nosso exemplo, no ano de 2002, a grande final do campeonato americano de futebol teve a edição mais emocionante da história. Um pequeno time sem muita tradição no esporte enfrentava um adversário que vinha de uma campanha muito sólida. Durante o jogo, o favorito permaneceu sempre à frente do placar, mas o pequeno time insistia em não se entregar. Para aumentar o drama, a principal figura do time menor havia se machucado e não pôde jogar a grande final. Em seu lugar, assumiu um reserva sem muita expressão, o quarterback Tom Brady (ele mesmo, mundialmente famoso marido da Gisele Bundchen). Brady havia conseguido uma classificação sofrível no Teste Wonderlick, e suas estatísticas também não eram muito animadoras. Entretanto, entre suas características, constava: decisionmaker, ou seja, aquele jogador que não "amarela" nas decisões. Naquela noite, a pouco mais de 2 minutos do final da partida, o time de Brady conseguiu empatar o placar. A essa altura do jogo, a prorrogação parecia ser o melhor para todos: acalmar os ânimos, reorganizar a estratégia e usar o tempo disponível para pensar em como vencer o adversário. A posse de bola pertencia ao time de Brady, mas eles não estavam dispostos a abrir mão da vitória. Em 1min22seg o time de Brady virou a partida e entrou para a história do futebol americano como o protagonista da mais sensacional final de campeonato já disputada. Após o jogo, Brady foi entrevistado por diversos jornalistas e revelou como conseguia as melhoras jogadas para o seu time, apesar de todas as pressões que envolvem o jogador no momento da decisão: "Eu não sei como eu sei onde passar a bola. Não há regras fixas. Eu apenas sinto que eu estou indo para o lugar certo. E é onde eu jogo a bola".
Essa revelação nos faz pensar sobre muitos aspectos que envolvem sucesso e fracasso no momento de decisão, seja ele dentro de campo ou em um concurso: não importa o quão bom você é em raciocínio lógico-matemático ou qualquer outro tipo específico de pensamento: sob pressão para decidir, não há tempo para pensar. Na hora do jogo, não é possível levar em consideração todas as alternativas possíveis, as variáveis que envolvem cada opção e as consequências de cada decisão tomada. Nesses momentos, o que vai guiá-lo ao seu melhor resultado são as emoções que governam os seus comportamentos.
Na próxima semana continuaremos com nossa argumentação sobre o papel das emoções na construção do sucesso em concursos.
Flávio Ribeiro de Paiva é Psicólogo formado pela UFRGS, Personal e Professional Coach pelo Behavioral Coaching Institute - New York, através da Sociedade Brasileira de Coaching - São Paulo. Está vinculado a outros grandes institutos de Coaching e Desenvolvimento humano no Brasil e no exterior e possui larga experiência pessoal de sucesso em provas e concursos de diversos órgãos, como Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, TRF-4 e Polícia Rodoviária Federal.
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