A semana promete ser decisiva para milhões de trabalhadores brasileiros, já que o Supremo Tribunal Federal (STF) retoma o julgamento sobre a correção das contas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) na próxima quarta-feira, 18 de outubro. O resultado pode ter implicações significativas, especialmente no acesso à moradia para as camadas mais pobres da população.

O processo, proposto em 2014 pelo partido Solidariedade, começou a ser analisado em abril, mas um pedido de vista do ministro Kassio Nunes Marques interrompeu o julgamento. Atualmente, o rendimento do FGTS é calculado pela Taxa Referencial (TR) mais 3% ao ano. Se a mudança proposta for aceita, a correção seria de TR mais 6% ao ano, o mesmo índice utilizado atualmente para a poupança.

Possíveis impactos no Programa Minha Casa, Minha Vida

De acordo com a Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), essa mudança na regra pode resultar em um aumento de até 3 pontos percentuais nos financiamentos que utilizam o FGTS. Isso afetaria diretamente as famílias beneficiárias do programa Minha Casa, Minha Vida (MCMV), cujas parcelas poderiam se tornar mais onerosas.

Luiz Antônio França, presidente da Abrainc, alerta que o impacto seria dramático, afetando três em cada quatro beneficiários do MCMV. Além disso, ele destaca que a mudança também teria implicações críticas para os empregos gerados pelo programa, impactando cerca de 1,3 milhão dos 2,7 milhões de postos de trabalho.

O FGTS é uma fonte crucial de recursos para o crédito imobiliário destinado a famílias de baixa renda, permitindo taxas de juros mais acessíveis. Se o FGTS render mais, o custo dos recursos aumenta, tornando os juros do crédito imobiliário mais elevados. Estudos da Abrainc indicam que essa alteração poderia retirar o acesso à casa própria de 13 milhões de famílias de baixa renda.

Impacto nos mais vulneráveis e na economia

França ressalta que 85% dos cotistas do FGTS ganham menos de quatro salários mínimos, e o benefício é significativo para essas famílias que buscam ter uma casa própria. Além disso, a mudança na correção pode resultar em um decréscimo de até 1 ponto percentual no Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro em 2024.

O ex-presidente do Banco Central, Gustavo Loyola, reforça a preocupação, destacando que a mudança na correção tornaria o crédito imobiliário mais caro, podendo inviabilizar a aquisição de moradia para a população mais pobre.

Disputa e argumentos do Governo

O governo é contra a mudança na correção do FGTS, citando impactos bilionários no fundo, especialmente se houver a necessidade de "reembolsar" valores retroativos. O argumento é que as alterações legislativas em 2017 e 2019 modificaram a forma de remuneração das contas do FGTS, distribuindo parte dos lucros aos trabalhadores.

A Advocacia-Geral da União (AGU) argumenta que a nova forma de cálculo trouxe remunerações "superiores" às da TR e à inflação, tornando a mudança desnecessária.

Possíveis consequências e próximos passos

Caso a mudança seja implementada, o acesso à moradia para milhões de brasileiros pode ser comprometido. A decisão do STF, segundo Luís Roberto Barroso, relator do processo, começará a valer a partir da publicação da ata.

No entanto, o Congresso Nacional terá a responsabilidade de decidir sobre a correção dos valores passados.

O temor do governo e da Caixa Econômica Federal é o impacto financeiro retroativo, que poderia resultar em uma cobrança bilionária. Se a nova regra valer apenas a partir da decisão do STF, ainda assim, há preocupações com os custos para o fundo.

Com 758.679 processos pendentes de julgamento sobre a revisão do FGTS, a decisão terá amplas repercussões. O presidente do Instituto Fundo de Garantia do Trabalhador estima que a correção poderia chegar a R$ 750 bilhões se retroativa desde 1999, caso o fundo fosse corrigido pelo INPC.