Uma das notícias que chamou a atenção nessa semana foi a de uma mensagem interna enviada pela Marinha a seus oficiais, dando 90 dias para que os militares da ativa se desfiliem de partidos políticos caso estejam associados a algum deles.

Esse nota foi enviada logo após um encontro do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva com a cúpula da Marinha e, segundo as informações obtidas pela imprensa, o não cumprimento dessa solicitação pode resultar em punição para os militares.

O documento estava orientando, inclusive, que todos os militares verificassem se estão filiados ou não e em caso positivo, que eles providenciassem o desligamento. "É possível que, em determinados casos, a filiação tenha se dado antes do ingresso do militar no serviço ativo ou até mesmo sem sua ciência ou consentimento", diz o documento.

Registro do encontro do Presidente Lula com o Almirantado do Comando da Marinha. Créditos: Ricardo Stuckert/Agência Brasil
Registro do encontro do Presidente Lula com o Almirantado do Comando da Marinha. Créditos: Ricardo Stuckert/Agência Brasil

A tônica desse comunicado muda bastante o que se viu nos últimos anos especialmente porque durante o governo anterior, de Jair Bolsonaro, houve vários militares que não só se associaram a partidos como assumiram cargos políticos.

Diante disso, vem à tona um questionamento: afinal, militares podem ou não se filiar a partidos políticos?

Militar pode se filiar?

O próprio documento publicado pela Marinha já dá indícios da resposta a essa pergunta:

"Com o propósito de cumprir a legislação vigente, decorrido o prazo estipulado de 90 dias sem que haja a correspondente desfiliação, serão adotadas as medidas disciplinares cabíveis em decorrência do eventual descumprimento da norma constitucional".

E a resposta está na Constituição Federal. O Artigo 142, Parágrafo 3º, Inciso V , diz o seguinte:

Art. 142. V - O militar, enquanto em serviço ativo, não pode estar filiado a partidos políticos;

Isso vale tanto para militares do Exército, quanto da Marinha e da Força Aérea. E notas anteriores já divulgadas pelas Forças Armadas apontava-se que periodicamente são realizados levantamentos junto do efetivo a fim de verificar o cumprimento dessa lei.

Por exemplo, em um documento publicado em 2021 pela FAB, em sua página oficial na internet, descata-se que esses levantamentos são conduzidos com base em três principais hipóteses:

  • militar filiou-se antes de ingressar no serviço ativo;
  • militar foi indevidamente filiado ou inscrito sem consentimento; e
  • militar solicitou filiação enquanto no serviço ativo.

A nota aponta ainda que "em todos os casos, as informações são enviadas aos Comandos setoriais para os procedimentos administrativos cabíveis".

Na averiguação realizada em 2020, foram encontradas 908 filiações (aproximadamente 1,3% do efetivo da FAB) a 29 partidos políticos. Em 2021, um novo levantamento apontou 221 registros de filiações em 26 partidos.

Militar pode se candidatar?

E aí surge essa outra pergunta: então, militar pode se candidatar em uma eleição para concorrer a um cargo político?

Também de acordo com a constituição - páragrafo 3º do artigo 14 - uma das condições de elegibilidade é a filiação partidária. Veja:

Art. 14, 3º São condições de elegibilidade, na forma da lei:

(...)

V - a filiação partidária;

Porém, se um militar não pode ser filiado, ele é considerado elegível? A resposta é sim, porém com algumas condições. O documento diz o seguinte:

Art. 14, 8º - O militar alistável é elegível , atendidas as seguintes condições:

I - se contar menos de dez anos de serviço, deverá afastar-se da atividade; II - se contar mais de dez anos de serviço, será agregado pela autoridade superior e, se eleito, passará automaticamente, no ato da diplomação, para a inatividade.

Nesse caso, entretanto, os especialistam entendem que a filiação partidária não é exigida dos militares como condição de elegibilidade. E assim, a filiação, por certo, deve acontecer após a eleição.

E militares da reserva ou reformados?

Para os militares que já cumpriram seu tempo de serviço e que se encontram inativos, a legislação é diferente.

Nesse caso, segundo o documento "Elegibilidade e Filiação Partidária de Militares" publicado pela Consultoria Legislativa da Câmara dos Deputados, a filiação partidária não é vedada e eles podem proceder como qualquer outro cidadão brasileiro.

Vale destacar:

  • Militar da reserva: pertence à reserva das Forças Armadas e estão sujeitos ainda à prestação de serviço em caso de convocação;
  • Militar reformado: aquele que já está dispensado definitivamente da prestação de serviço.

Despolitização das Forças Armadas

O que está acontecendo no Brasil atualmente é um esforço pela despolitização das Forças Armadas. O atual governo se mostrou, desde a eleição, contrário às práticas de eleição e entrega de cargos políticos à militares e vem agindo para mudar o cenário que se via nos últimos anos.

Inclusive, nesse sentido, na última terça-feira, 14 de março, o ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, entregou uma proposta de Emenda à Constituição (PEC) que propõe proibir que militares da ativa assumam cargos políticos.

Assim, a legislação atual, que permite isso caso o militar se afaste de suas funções, poderá mudar para uma proibição total. O documento ainda está no Palácio do Planalto e deve ser encaminhado em breve pelo governo ao Congresso.